Há bocadinho vinha na rua e passei numa estrada ladeada de velas, deve ser uma daquelas procissões que se fazem nesta altura por causa da Páscoa, estava bem bonito! Fez-me recordar de quando era miúda e ia a estas procissões.
Quando nasci não fui para infantários ou cresces, fiquei em casa. A minha mãe não trabalhava na altura e tomou conta de mim, da minha irmã e do meu primo. Brincávamos na rua, apanhávamos amoras das silvas no verão e fazíamos um puré de amoras bem vermelhas escuras com açúcar que tingiam, tudo da boca à roupa.
No Verão, passávamos o mês de Julho na praia de Espinho, só tínhamos que dormir a sesta primeiro até às 3h (e isso é que custava), íamos com um primo já quarentão que levava também a nora e um neto, éramos todos mais ou menos da mesma idade.Era o máximo...
Fiz seis anos e fui para a primária, no primeiro mês a minha mãe ia levar-me todos os dias, apanhávamos pelo caminho umas amiguitas lá da rua e lá íamos nós, elas todas contentes e eu a chorar porque tinha medo que acontecesse alguma coisa à minha mãe por causa dela estar sozinha, a minha irmã e o meu primo eram muito pequenos, não os achava com força suficiente para lhe valerem no caso de efectivamente acontecer alguma coisa. Foi assim o primeiro mês inteiro, só parava de chorar quando a professora entrava na sala e depois nem dava por ela da minha mãe sair sorrateiramente. E lembro isto tal e qual como se fosse hoje, o medo que sentia pela minha mãe, há coisas do caraças...
Ao lado de minha casa há um restaurante que já existia na altura, quando vínhamos da escola ao fim da tarde, passávamos em frente às janelas da cozinha e pedíamos batatas fritas, os cozinheiros que nos conheciam passavam-nas pela janela. Ainda hoje quando lá vou buscar comida me tratam por vizinha. Na altura dos santos populares, fazíamos uma cascata, comíamos rápido para vir para a rua pedir "uma moedinha para o Santo António", claro que juntávamos muito dinheiro que depois gastávamos no S. Tomé, a mercearia da rua que vendia entre outras coisas chá e café ao quilo em pacotes de papel (tem um nome especifico acho que são cartuchos..), e é este cheiro característico dali que também não esqueço. Ah, comprávamos lambarices tá claro.
Eu também ia aos cartuchos de café. Tínhamos uma mercearia de esquina em Lisboa cujo cheiro ao café sentia-se da rua. Eles moíam o grão na hora... que maravilha!